de 21.maio a 21.julho de 2021
A expressão artística tem muitos processos, particulares para cada artista, mas com um ponto em comum: o resultado final é sempre um transbordamento. Esse turbilhão que transcende o “eu” do artista e vira um objeto físico (ou virtual, no nosso tempo de relações tecnológicas) é um processo que fala muito sobre o seu âmago, mas principalmente sobre a sua necessidade de falar, de gritar, de ser ouvido.
Entender o trabalho de Nazaré Soares, que é a mãe, artista visual e professora cearense, radicada em São Paulo, é se debruçar em sua própria história – ou seu processo de cura. Mãe de duas filhas, a artista tem em sua produção o rastro de um feminicídio, derrubando uma parede que separa o ego artístico com a necessidade pessoal dessa mulher de falar e compartilhar conosco sua história, suas angústias e seus sentimentos.
Seu trabalho, que leva as bonecas Abayomi, faz parte desse processo. As bonecas, que tem em seu nome o significado de “aquele que traz felicidade e alegria”, mostram que essa cura é mais do que um sarar raso de uma ferida ou cicatriz, ela é um processo de diversas camadas e com profundidades diferentes, em que a casca é apenas a ponta dessa dor.
Mas longe desses trabalhos serem carregados apenas por essas cicatrizes. Eles trazem felicidade, uma sensação de esperança e, principalmente, um gosto de infância. Ver e tocar uma obra de Nazaré Soares é retornar à infância, ao afeto e as trocas – e isso é o que mantem o seu trabalho vivo. Os tempos verbais e pronomes são intrínsecos em seu trabalho, que em tramas ou espirais, vão criando coletivos e “nós”, muito pra além do “eu” e “tu”.
Espero que vocês se divirtam com esse trabalho e sintam, como eu senti, esse sopro de “cura”.
Paulo Farias
Curador
_eu e tu
Resistência (2021)
Nuala (2021)
Sem título (2021)
elas_
Desperta (2021)
Lembranças (2021)
_nós, vós
Pra não te perder / Encontro preciso (2021)